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05/12/19

Esquerdinos versus destros (3)

Os testes clássicos de lateralidade nem sempre são capazes de distinguir a mão mais propícia para a escrita, uma vez que esta é uma atividade complexa e sujeita a constrangimentos sociais.
O problema da escolha da mão escrevente coloca-se, muitas vezes, por volta dos 6 anos de idade, quando a criança já tem uma prática escolar e os pais se questionam sobre o porquê dos seus filhos escreverem mal. Se as pressões do meio entrarem em ação, a criança coloca-se, inconscientemente, vários problemas, como satisfazer o desejo dos pais, contrariá-los, imitar um familiar, ou um colega, ou singularizar-se.  Convém não nos esqueceremos que a criança se vai apercebendo que o mundo da tecnologia foi construído para a destro, podendo sentir-se, como que, hostilizada.
O sentido da nossa escrita é da esquerda para a direita, como é sabido.  Algumas escritas como a arábica e a hebraica desenvolvem-se da direita para a esquerda, mas possuem uma civilização e uma caligrafia diferentes das ocidentais.
No mundo ocidental, o movimento da escrita procede do centro do corpo do escrevente para o exterior e a posição natural da mão é por baixo da escrita. Para o esquerdino, o movimento inicial processa-se do exterior para o interior do corpo e a posição por baixo da linha, que normalmente lhe é imposta, tem tendência a bloquear o seu cotovelo contra o corpo.  O esquerdino escreveria melhor se colocasse a mão lateralmente, mas esta arrastar-se-ia sobre a escrita, escondendo-a e sujando-a.
Enquanto o destro coloca, naturalmente, a folha em que escreva na posição diagonal ascendente, o esquerdino escreverá com maior facilidade se a colocar em diagonal descendente.
O esquerdino escreve contranatura, pois, em vez de puxar pelo instrumento é obrigado a empurrá-lo, o que dificulta o traçado cursivo da escrita. De facto, o sentido ideal de escrita por parte do esquerdino seria da direita para a esquerda. Sentido esse adotado naturalmente por algumas crianças esquerdinas, no início da aprendizagem. Transpondo, incorretamente, os movimentos num sentido, que não o seu, o esquerdino faz, muitas vezes, as vogais ao contrário.  E quando na escola imita os gestos da professora destra, pode desenvolver alguma descoordenação a nível de esquema corporal e de estruturação espacial.
Torna-se importante:
- Escolher um instrumento de escrita de boa qualidade, a fim daquele deslizar com facilidade sobre o papel.
- Adotar a posição em que se sinta mais à-vontade, mesmo colocando a mão a da parte de cima da linha, apesar de ser menos estética do que a posição por baixo da linha.
- Verificar a posição do corpo para não ficar contraído.
- A posição da folha deve ser com inclinação inversa à do destro, com o canto superior esquerdo ligeiramente mais acima do que o direito e ligeiramente mais chegada para lado esquerdo.
- Corrigir desde o início o sentido da escrita e o traçado especular (este tipo de escrita também pode acontecer em crianças que, sendo destras, têm distúrbios de estruturação espacial).
Segundo estudos efetuados por Ajurriaguerra, por Hécaen e de acordo as minhas próprias observações, os esquerdinos, como norma, escrevem com menor qualidade do que os destros, especialmente na fase da aprendizagem.
Enfim, existem marcas na escrita do esquerdino que o identificam, mas que não são totalmente discriminantes por serem difíceis de distinguir após a escrita já estar feita. Não obstante todas estas observações, há casos de esquerdinos que se servem desde cedo da mão esquerda com grande habilidade.
Afonso Sousa

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