NOVIDADES

02/02/24

A grafologia na Escola (2)


A velocidade da escrita

 

A velocidade é travada devido às múltiplas paragens, hesitações e retoques. Na  escrita do António aparecem sinais que apontam no sentido de retração e dificuldades nos contactos sociais, como alguns espaços largos entre as palavras, as linhas espaçadas e as letras apertadas. Os retoques podem ser sinal de compensação afetiva

 

Tendo em vista recolher amostras da velocidade da sua escrita para confirmar se era lenta ou rápida, realizei com ele individualmente um pequeno teste.

Escreveu o mais depressa possível, durante três minutos, a frase: As aulas estão quase a chegar ao fim.

O António realizou o teste repetindo sempre a frase inteira. Uma vez que é esquerdino, poderia ter optado por colocar em várias linhas, ao mesmo tempo, alguns conjuntos de palavras, o que lhe facilitaria a natural dificuldade de avanço para a direita.

Outro aluno esquerdino também testado, com dez anos de idade, escolheu aquela estratégia e conseguiu uma maior rapidez.

No início da folha pautada escreveu uma vez a referida frase para se familiarizar com as palavras e não precisar de olhar para o quadro e perder tempo. Disse-lhe que poderia utilizar o instrumento que desejasse: escolheu a esferográfica azul. Cronometrei três minutos.

O aluno colaborou e escreveu muito mais depressa do que costumava. Conseguiu fazer uma média de 89 letras por minuto. Média alta em relação à lentidão normal da sua escrita, mas baixa se a compararmos com outros alunos do 5º e 6º anos de escolaridade em que as médias sobem. Em duas turmas com alunos de 10/11 anos, a média de letras dos rapazes por minuto foram de 112 e das raparigas de 123. Em duas turmas de 11/12 anos os rapazes obtiveram 113 e as raparigas 117.

 

A escrita do António, apesar da baixa velocidade, apresenta-se muito mais regular do que anteriormente.  Notam-se retoques no f da penúltima palavra fim e no a inicial da  palavra aulas. As hastes dos tt continuam invertidas, com as barras colocadas completamente à esquerda. Os pontos dos ii apresentam-se ligeiramente mais avançados do que na sua escrita normal.

 

Afonso Henrique Maça Sousa


18/12/23

A grafologia e educação (1)


 

Sobre este tema vou publicar  quatro artigos relacionados com as caraterísticas da escrita de António, sua interpretação e atitudes a desenvolver

António e a sua escrita

 

António (nome fictício) tem 14 anos e frequenta  o 6º ano de escolaridade.

O seu bigode já despontou. Ficou retido duas vezes: uma no 1º ano de escolaridade e outra no 5º ano.

É teimoso, lento, distraído, verbalmente agressivo e pouco estudioso. Por vezes, chega a ser indisciplinado e desobediente.

António não gosta da escola, porque as “aulas são uma chatice, muito lentas e pouco animadas”, “os professores são duma certa idade, não aceitam uma brincadeira, é mesmo por isso que eu não gosto destas escolas”, “não gosto de ficar preso, nem de acordar cedo”.

Tem fraco aproveitamento escolar, com resultados negativos no 1º e 2ºperíodos de avaliação. Lê e escreve com bastantes incorreções. Sente-se, naturalmente, desmotivado. É nervoso e não consegue estar quieto na cadeira.

Gosta de “andar de bicicleta, de mota ou de cavalo e fazer campismo.”

Gosta de liberdade e de sair de casa.

 No 5º ano de escolaridade,  António omitia várias letras, fazia o “m” semelhante ao “n”, confundia “o” a com o “e”, o “q” com o “c”, o “b” com o “v”, o “l” com o “lh”, trocava  até uma letra do seu apelido.

 Certo dia, fiquei na sala a conversar com um aluno da sua turma e, ele, em vez de sair, escondeu-se na arrecadação para  ouvir a conversa.

 A diretora de turma informou-me que lhe tinham apresentado queixa do António por andar a apalpar as colegas. Parece extrovertido, mas fecha-se muito.  Pois, nos intervalos  passa o tempo ao pé dos funcionários e em vez de ir brincar com o grupo. É medroso, mas faz bastantes ameaças. Está desmotivado e distraído, liga pouco às aulas.

Através da análise da sua escrita irei procurar detetar alguns indícios do fraco desempenho escolar e do comportamento do António. 

 A sua mãe que explora um café nas proximidades da escola, confessou  que, quando o filho nasceu, tomava muito cafés e andava agitada.

O António não dorme o suficiente. Deita-se depois da meia noite, ficando com a mãe no café até este encerrar, e levanta-se sempre às 07,30 da manhã. O pai está muitas vezes ausente. Ambos têm uma imagem negativa da escola e dos professores, o que não ajuda nada o desempenho do filho.  A escola que ature o filho, porque ela (a mãe) tem a sua vida.

 A diretora de turma – confessa a mãe – está sempre a chateá-la para que vá à escola falar com ela.

Reconhece que o filho é muito nervoso e tímido e que os professores não têm sabido levá-lo com jeito. Quando ele está mal disposto, não obedece a ninguém e não vale a pena insistir.

 

Disgráfico e disléxico

 Num texto livre que escreveu sobre as férias de verão, encontrei caraterísticas relevantes para a compreensão da sua personalidade.

 António é esquerdino por natureza, mas escreve com a mão direita.  Como o sentido da escrita cursiva se processa da esquerda para a direita, a criança destra tem mais facilidade em escrever do que a esquerdina. E, devido à forma dos carateres, o mancinismo constitui uma predisposição para a disgrafia. O mesmo acontece com o António, apesar de escrever com a mão direita.

Todo o traçado da escrita manual se torna menos natural para o esquerdino, uma vez que este empurra a esferográfica em vez de a puxar, o que de certo modo entrava o movimento cursivo. O sentido natural da escrita de um esquerdino deveria ser da direita para a esquerda.  A realização de movimentos no sentido oposto, ao que lhe seria mais favorável, cria-lhe confusão e acrescidas dificuldades na própria estruturação do espaço. Por isso, em situações normais, os esquerdinos não escrevem tão bem como os destros.

É, pois, necessário, desde o início da aprendizagem, estar atento às inversões e à escrita especular. A reeducação da escrita é sempre um processo muito moroso, e consiste essencialmente na associação dos fonemas mais confundidos aos grafemas correspondentes, fazendo sempre apelo à atenção e ao raciocínio.

A disgrafia anda associada à dislexia. Esta precisa de ser tratada com um método de ensino apropriado, após uma despistagem atempada e oportuna, não demasiado cedo nem tarde demais. Deve ter-se presente que no início da escolaridade quase todas as crianças fazem inversões e  confusões, que acabam por desaparecer com o tempo.

O disléxico apresenta um gesto gráfico lento, muitas vezes, cortado, podendo entrar em contacto anguloso com a linha. Apresenta má coordenação ou cria espaços irregulares entre as letras e  as palavras. Surgem retoques e emendas abundantes, devido a dificuldades ortográficas e à deficiente aprendizagem da escrita.

No que respeita a forma, a escrita dos disléxicos apresenta pouca originalidade, sem complicações nem floreados, porque a falta de domínio do ato de escrever não lhe permite grande liberdade.

Este aluno apresenta evidentes sintomas de dislexia, pois, ao ler um texto simples e pequeno, confunde as palavras por com pois, pois com pôs, rapaz por capaz.

Afonso Henrique Maça Sousa

 

23/10/22

A perícia da escrita Manual - Considerações

Definição de escrita

1.       Cada indivíduo tem uma escrita a própria, que se distingue de todas as outras, porque é o resultado de atos psíquicos e neurofisiológicos singulares.
Como todas as pessoas são diferentes, não existem duas escritas iguais.

2.       Até os grafismos feitos pelo mesmo escrevente apresentam sempre algumas dissemelhanças, porque os micro gestos, ocasionados pelas múltiplas interações, nunca são executados exatamente da mesma maneira.

3.       Qualquer grafismo resulta da conjugação de fatores de ordem cerebral, de memória, neuronal, motora e muscular.

Objetivo da perícia de escrita manual

1.       O exame pericial da escrita manual, de acordo com o quesito, consiste na determinação da autoria de documentos contestados, através da comparação de suas caraterísticas com as de documentos contestados.

2.       Complementar ao exame pericial pode ser o recurso à grafonálise para apoio na resolução de determinados casos criminais como a designada “mão forçada”, em que alguém é forçado física ou psicologicamente a assinar determinado documento, restando as marcas da coação, como por exemplo, tremuras, pressão e ângulos que não podem ser consideradas de disfarce (Francisco Viñals e Mª Luz Puente (Universidade Autónoma de Barcelona).

Método

1.       Na análise macroscópica, são observados e comparados, genericamente, os documentos autênticos e os contestados, quanto aos hábitos de escrita, verificando a organização espacial (espaço entre linhas e entre palavras, margens, nível de escrita), a espontaneidade, a legibilidade, a forma, a proporcionalidade dimensional, a direção da linha, a pressão, a velocidade, a inclinação e a ligação.

2.       Na análise de pormenor, são observadas, comparadas e explicadas, detalhadamente, as semelhanças e diferenças dos documentos autênticos e contestados com base no traçado (sentido dos movimentos, grau e tipo de conexão, forma e espaço entre letras, pontos de arranque e de remate), a pressão, a angulação/curvatura, as tremuras, a acentuação, a pontuação, os gestos-tipo e outras particulares específicas dos grafismos observados.

Premissas                                                                                                                                       

1.        Apesar da variabilidade, a escrita mantem-se relativamente constante ao longo da vida, criando hábitos gráficos.

2.       Existem pequenas variações naturais nas escritas e nas assinaturas, mas quando duas ou mais escritas ou assinaturas forem exatamente iguais, alguma delas é falsa.

3.       A avaliação da pertinência das caraterísticas depende da qualidade, da quantidade e da peculiaridade das mesmas.

4.       Para distinguir escritas ou assinaturas verdadeiras de falsas é necessário inventariar as suas caraterísticas e compará-las, servindo-se fundamentalmente de documentos originais.

5.       Determinadas circunstâncias físicas ou psíquicas podem alterar alguns parâmetros da escrita.

6.       A individualidade da escrita é independente do membro que a executa, porque é influenciada por fatores neurológicos e cerebrais.

7.       A assinatura tem um valor diferente dos outros grafismos porque constitui uma marca privilegiada e única de identificação.

8.       A assinatura e escrita falsificadas ou auto-falsificadas nunca são iguais às autênticas, porque não são espontâneas e ficam as marcas do esforço para contrariar os hábitos gráficos, perdendo velocidade e espontaneidade.

9.       Para atribuir a mesma autoria a determinado documento suspeito não pode existir nenhuma diferença fundamental entre os documentos autógrafos e o suspeito. E, para Buquet e Cristofanelli, as diferenças assumem maior valor do que as semelhanças.

10.   Sempre que possível, e no caso de dúvida, devem recolher-se, criteriosamente, autógrafas junto dos sujeitos suspeitos de autoria de documentos ou assinaturas.

11.   É mais próprio de um escrevente habilitado fazer uma escrita de grau inferior do que um escrevente de baixo nível fazer uma escrita grau superior.

12.   A escrita não é analisada unicamente na materialidade morfológica, mas sobretudo na sua manifestação dinâmica, pois é no movimento que a pessoa revela a sua autêntica natureza.

13.    A forma material da escrita não nos dá o direito, enquanto tal, de concluir pela identidade da mão.

14.   Ninguém consegue modificar a sua escrita natural sem deixar o sinal do esforço realizado para disfarçar (na distribuição espacial, no ritmo, nas formas geométricas, nos gestos-tipo).

15.   A escrita não é analisada unicamente na materialidade morfológica, mas sobretudo na sua manifestação dinâmica, pois é no movimento que a pessoa mais revela a sua autêntica natureza.

16.   As conclusões devem ser claras, concretas e concisas.

Equipamentos mínimos necessários

1.       Lupa milimétrica Hipower12x

2.       Microscópio Digital Ceslestron Handheld, ampliação até 200x

3.       Software Paint.net v 4.2.14

4.       Máquina fotográfica digital

5.       Ferramentas de recorte do Windows

6.       Vários tipos de iluminação

7.       Modelos grafonómicos para medição de forma, dimensão e angulação

Conclusão

1.       Do confronto entre os vários grafismos resultará uma avaliação qualitativa das marcas semelhantes e dissemelhantes, pericialmente mais pertinentes, neles detetadas.

2.       O resultado obtido será expresso termos de probabilidade, de acordo com a seguinte tabela de referência:

 

Tabela de Referência

 

Níveis positivos

 

             Níveis negativos

1.       Muitíssimo provável sim

2.       Muito provável sim

3.       Provável sim

 

            Inconclusivo

1.       Muitíssimo provável não

2.       Muito provável não

3.       Provável não

 

 

 


Os níveis “muitíssimo provável (sim ou não)” estão próximos da certeza plena da autoria dos documentos contestados ou da sua negação.

Os níveis intermédios refletem graus de certeza variáveis, dependendo da qualidade e quantidade das caraterísticas mais marcantes.                                  

O nível “inconclusivo” resulta da ausência de condições ou escassez de elementos de comparação diferenciadores nas escritas em confronto.


 

              Afonso  Henrique Maça Sousa

             Mestre em Grafoanálise, especialidades de grafística, grafopatologia e grafologia forense

19/10/21

Falsificação de documentos e meios de deteção (2)


Escrita de assassino em série

O falsificador coloca uma folha transparente sobre o documento e decalca-o, depois, servindo-se da transparência, constrói outro igual. Pode aproveitar o vidro duma janela ou o tampo transparente duma mesa para elaborar a cópia falsificada. Pode fazer uma fotocópia normal do documento original decalcando-a com uma ponta seca ou com lápis e, depois, passando por cima a caneta ou esferográfica igual à do original. Nestes casos, é fácil afirmar que há falsificação, mas torna-se difícil identificar o falsificador.

A falsificação por sobreposição (imitação servil) ou por decalque deixa indícios nas retomas, nas ligações, na pressão (menor diferença entre pleno e perfis), nas tremuras, no excesso de identidade. O falsificador tenta não fazer a sua própria letra, mas imitar a letra de outrem. O traçado é lento, frouxo, hesitante, a pressão entre perfis e plenos aparece pouco diferenciada, com pequenos e múltiplos tremores, com falta de dinamismo e de tensão, com interrupções, com retoques, com algumas paragens da caneta, com excesso de semelhanças na dimensão e formas iguais às da escrita autenticada. Uma fotocópia em papel de acetato do documento contestado e a sua sobreposição sobre o documento autêntico ajudará a detetar as igualdades formais, pois, o paralelismo ou sobreposição são a prova da falsificação. O perito também pode servir-se do negatoscópio (vidro da janela ou mesa de vidro com lâmpada por baixo).

O perito encontrará maiores dificuldades, se a escrita autenticada for lenta e com predomínio da forma. Se a autenticada for tremida (o perito deve saber distinguir as tremuras das sacudidelas angulosas de quem sofre de alguma patologia nervosa das sacudidelas intencionais do falsificador), se a cópia falsificada se basear em outro documento autenticado do autor imitado.

Por imitação reiterada

A falsificação por memorização acontece após intenso treino e familiarização com o modelo a imitar. O falsificador consegue escrever com uma velocidade semelhante à da sua escrita autêntica. Neste caso, o perito deve procurar os detalhes do próprio estilo (gestos específicos) do falsificador que constituem uma espécie de tiques gráficos. Ao confrontar o documento falsificado com os autênticos, o grafólogo constatará a existência de determinados microgestos originados por impulsos psicomotores que constituem uma parte instintiva da personalidade e dos quais não se pode prescindir.

Estas pequenas marcas costumam ser tanto mais valorizadas na perícia quanto mais seja a sua constância, a sua pouca visibilidade e a dificuldade de imitação.

De entre os sinais mais difíceis de imitar constam a própria natureza do traçado com o seu jogo de plenos e perfis (dependentes da conjugação da pressão com a velocidade) e a sucessão de movimentos gráficos (proporção, elasticidade, dinâmica).

O examinador da escrita não se limitará a simples comparações estáticas, mas saberá captar as caraterísticas dominantes e a dinâmica das tendências psíquicas do sujeito escrevente.

Por autofalsificação

A autofalsificação consiste na imitação da própria escrita de modo que pareça imitada ou decalcada por outros (fenómeno raro e utilizado mais na assinatura). O autofalsificador nega a assinatura que ele próprio fez, diferente da verdadeira, com a clara intenção de enganar e de negar o conteúdo que assinou.

A análise da autofalsificação pode levar o perito ao engano, porque tanto na assinatura verdadeira como na autofalsificada há gestos dinâmicos e não apenas variações de forma e de tamanho.

Por alteração

Alteração de qualquer tipo de documento ou assinatura por apagamento (raspando, rasurando, recortando, lavando,) ou acrescentamento (reescrevendo, corrigindo, aplicando truques fotográficos, intercalando letras, palavras ou linhas).

Para detetar as raspagens (com safa de borracha ou outros instrumentos) utiliza-se a luz rasante ou micrómetro a fim de observar e medir as fibras do papel ou da zona raspada. No caso de acrescentos, interpolação ou alteração (letras, datas ou valores monetários) pode usar-se o microscópio ou fotografia ampliada para observar as diferenças cromáticas da tinta. Também são utilizados produtos químicos, porém, neste caso, é preciso ter cuidado para não danificar o suporte e o conteúdo escrito. Às vezes, basta a presença duma data anacrónica para detetar a falsificação. As rasuras com esferográfica, caneta, marcador ou lápis podem ser detetadas com fotografias ou com telecâmara equipada com infravermelhos. 

Há casos em que a pessoa lesada reconhece a sua assinatura ou rubrica, mas nega o conteúdo ou dados do documento (declaração, cheque ou letra) que terão sido introduzidos posteriormente pelo falsificador em espaços deixados em parte ou totalmente em branco. Neste caso, se o texto for mecanográfico, a falsificação poderá ser detetada pelos exames de documentoscopia e de sociolinguística.

É conveniente que as várias fases do exame de escrita sejam comprovadas através de micro ou macrofotografias ou digitalizações.

Por anonimografia 

Trata-se de pessoa incerta que escreve cartas ou panfletos sem os assinar, nem se identificar, muitas vezes, com a finalidade de denunciar ou censurar.

O anonimógrafo (pessoa que escreve cartas anónimas) pode simular menor cultura, empregando termos mais vulgares; pode dar erros ortográficos, intencionalmente; pode usar uma linguagem artificial. Por isso, o perito tem que estar atento às expressões que, por desatenção ou inconscientemente, escapem ao autor do manuscrito, como termos cultos, palavras difíceis mal acentuadas, ou artificialidade forçada.

As alterações mais comuns acontecem na forma: letras tipográficas maiúsculas, escrita infantil ou completamente diferente, alterações da dimensão.

Existem  alguns aspetos que escapam ao falsificador, tais como:

o espaço entre letras, palavras, linhas e estrutura da página,

o movimento que se torna mais lento, falta de fluidez, com os traços finais mais breves e controlados, pontuação precisa,

a artificialidade e rigidez controlada,

as ligações entre letras e continuidade,

o traçado (nítido ou pastoso),

a pressão (leve ou firme), relevo e pressão invertida,

a direção da linha,

o ritmo.

Os gestos-tipo coincidentes (ângulos, bucles, arpões, ligações, abertura dos ovais, acerados) merecem uma atenção redobrada.

Não é fácil descobrir os autores anónimos, especialmente se não houver suspeitos ou se a população for numerosa. O exame da escrita  pode ser complementado com a análise do próprio conteúdo, recorrendo à linguística e sociolinguística.  

Mão guiada, forçada ou inerte

Locard refere-se a três tipos de mão guiada: mão guiada propriamente dita, mão forçada ou constringida e mão inerte. A assessoria através da mão guiada ou assistida não é um facto negativo. Pode deixar algumas marcas, tais como, tremuras, angulosidades, sobreposições, golpes, palavras ascendentes, sinais de lentidão. A mão guiada de uma pessoa com Parkinson pode constituir uma assessoria razoável.

A mão forçada pressupõe uma luta desigual entre as duas mãos, coartando a vontade do escrevente e resultando numa escrita despedaçada, dilacerada, ilegível, com grinaldas, golpes, paragens e soldaduras.

A mão inerte pode ser a de um agonizante, paralítico ou analfabeto, resultando um grafismo idêntico e submetido ao da mão ativa.

Afonso Henrique Maça Sousa

Perito da Escrita Manual



19/09/21

Falsificação de documentos e meios de deteção

                    

Por sobreposição ou decalque

O falsificador coloca uma folha transparente sobre o documento e decalca-o, depois, servindo-se da transparência, constrói outro igual. Pode aproveitar o vidro duma janela ou o tampo transparente duma mesa para elaborar a cópia falsificada. Pode fazer uma fotocópia normal do documento original decalcando-a com uma ponta seca ou com 

lápis e, depois, passando por cima a caneta ou esferográfica igual à do original. Nestes casos, é fácil afirmar que há falsificação, mas torna-se difícil identificar o falsificador.

A falsificação por sobreposição (imitação servil) ou por decalque deixa indícios nas retomas, nas ligações, na pressão (menor diferença entre pleno e perfis), nas tremuras, no excesso de identidade. O falsificador tenta não fazer a sua própria letra, mas imitar a letra de outrem. O traçado é lento, frouxo, hesitante, a pressão entre perfis e plenos aparece pouco diferenciada, com pequenos e múltiplos tremores, com falta de dinamismo e de tensão, com interrupções, com retoques, com algumas paragens da caneta, com excesso de semelhanças na dimensão e formas iguais às da escrita autenticada. Uma fotocópia em papel de acetato do documento contestado e a sua sobreposição sobre o documento autêntico ajudará a detetar as igualdades formais, pois, o paralelismo ou sobreposição são a prova da falsificação. O perito também pode servir-se do negatoscópio (vidro da janela ou mesa de vidro com lâmpada por baixo).

O perito encontrará maiores dificuldades, se a escrita autenticada for lenta e com predomínio da forma. Se a autenticada for tremida (o perito deve saber distinguir as tremuras das sacudidelas angulosas de quem sofre de alguma patologia nervosa das sacudidelas intencionais do falsificador), se a cópia falsificada se basear em outro documento autenticado do autor imitado.

Por imitação reiterada

A falsificação por memorização acontece após intenso treino e familiarização com o modelo a imitar. O falsificador consegue escrever com uma velocidade semelhante à da sua escrita autêntica. Neste caso, o perito deve procurar os detalhes do próprio estilo (gestos específicos) do falsificador que constituem uma espécie de tiques gráficos. Ao confrontar o documento falsificado com os autênticos, o grafólogo constatará a existência de determinados microgestos originados por impulsos psicomotores que constituem uma parte instintiva da personalidade e dos quais não se pode prescindir.

Estas pequenas marcas costumam ser tanto mais valorizadas na perícia quanto mais seja a sua constância, a sua pouca visibilidade e a dificuldade de imitação.

De entre os sinais mais difíceis de imitar constam a própria natureza do traçado com o seu jogo de plenos e perfis (dependentes da conjugação da pressão com a velocidade) e a sucessão de movimentos gráficos (proporção, elasticidade, dinâmica).

O examinador da escrita não se limitará a simples comparações estáticas, mas saberá captar as caraterísticas dominantes e a dinâmica das tendências psíquicas do sujeito escrevente.

Por autofalsificação

A autofalsificação consiste na imitação da própria escrita de modo que pareça imitada ou decalcada por outros (fenómeno raro e utilizado mais na assinatura). O autofalsificador nega a assinatura que ele próprio fez, diferente da verdadeira, com a clara intenção de enganar e de negar o conteúdo que assinou.

A análise da autofalsificação pode levar o perito ao engano, porque tanto na assinatura verdadeira como na autofalsificada há gestos dinâmicos e não apenas variações de forma e de tamanho.

Por alteração

Alteração de qualquer tipo de documento ou assinatura por apagamento (raspando, rasurando, recortando, lavando,) ou acrescentamento (reescrevendo, corrigindo, aplicando truques fotográficos, intercalando letras, palavras ou linhas).

Para detetar as raspagens (com safa de borracha ou outros instrumentos) utiliza-se a luz rasante ou micrómetro a fim de observar e medir as fibras do papel ou da zona raspada. No caso de acrescentos, interpolação ou alteração (letras, datas ou valores monetários) pode usar-se o microscópio ou fotografia ampliada para observar as diferenças cromáticas da tinta. Também são utilizados produtos químicos, porém, neste caso, é preciso ter cuidado para não danificar o suporte e o conteúdo escrito. Às vezes, basta a presença duma data anacrónica para detetar a falsificação. As rasuras com esferográfica, caneta, marcador ou lápis podem ser detetadas com fotografias ou com telecâmara equipada com infravermelhos. 

Há casos em que a pessoa lesada reconhece a sua assinatura ou rubrica, mas nega o conteúdo ou dados do documento (declaração, cheque ou letra) que terão sido introduzidos posteriormente pelo falsificador em espaços deixados em parte ou totalmente em branco. Neste caso, se o texto for mecanográfico, a falsificação poderá ser detetada pelos exames de documentoscopia e de sociolinguística.

É conveniente que as várias fases do exame de escrita sejam comprovadas através de micro ou macrofotografias ou digitalizações.

Por anonimografia 

Trata-se de pessoa incerta que escreve cartas ou panfletos sem os assinar, nem se identificar, muitas vezes, com a finalidade de denunciar ou censurar.

O anonimógrafo (pessoa que escreve cartas anónimas) pode simular menor cultura, empregando termos mais vulgares; pode dar erros ortográficos, intencionalmente; pode usar uma linguagem artificial. Por isso, o perito tem que estar atento às expressões que, por desatenção ou inconscientemente, escapem ao autor do manuscrito, como termos cultos, palavras difíceis mal acentuadas, ou artificialidade forçada.

As alterações mais comuns acontecem na forma: letras tipográficas maiúsculas, escrita infantil ou completamente diferente, alterações da dimensão.

Existem sempre alguns aspetos que escapam ao anonimógrafo:

o espaço entre letras, palavras, linhas e estrutura da página,

o movimento que se torna mais lento, falta de fluidez, com os traços finais mais breves e controlados, pontuação precisa,

a artificialidade e rigidez controlada,

as ligações entre letras e continuidade,

o traçado (nítido ou pastoso),

a pressão (leve ou firme), relevo e pressão invertida,

a direção da linha,

o ritmo.

Os gestos-tipo coincidentes (ângulos, bucles, arpões, ligações, abertura dos ovais, acerados) merecem uma atenção redobrada.

Não é fácil descobrir os autores anónimos, especialmente se não houver suspeitos ou se a população for numerosa. O exame da escrita  pode ser complementado com a análise do próprio conteúdo, recorrendo à linguística e sociolinguística.  

Mão guiada, forçada ou inerte

Locard refere-se a três tipos de mão guiada: mão guiada propriamente dita, mão forçada ou constringida e mão inerte. A assessoria através da mão guiada ou assistida não é um facto negativo. Pode deixar algumas marcas, tais como, tremuras, angulosidades, sobreposições, golpes, palavras ascendentes, sinais de lentidão. A mão guiada de uma pessoa com Parkinson pode constituir uma assessoria razoável.

A mão forçada pressupõe uma luta desigual entre as duas mãos, coartando a vontade do escrevente e resultando numa escrita despedaçada, dilacerada, ilegível, com grinaldas, golpes, paragens e soldaduras.

A mão inerte pode ser a de um agonizante, paralítico ou analfabeto, resultando um grafismo idêntico e submetido ao da mão ativa.

Afonso Henrique Maça Sousa

Perito da Escrita Manual